O grande beneficiário da onda moralizadora de nossos dias brasileiros poderá vir a ser o PMDB: escoimado que seja dos que o maculam no exercício de cargos públicos, o partido, ainda o de maior capilaridade no Brasil, e com o maior número de filiados, poderá recuperar o seu espaço na opinião nacional.
Há velho axioma de que, na realidade, há apenas dois partidos em todas as comunidades políticas: o dos conservadores e o dos progressistas, enfim, a direita e a esquerda.
Quando surgiu, no bipartidarismo imposto pela força ditatorial, o Movimento Democrático Brasileiro reuniu em suas fileiras o melhor que havia em nosso país. A legenda era seletiva pela imposição da realidade: a ela aderiam os que podiam contar com as dificuldades e não esperavam benesses. Assim, reuniu amplo espectro, que ia da esquerda mais radical aos melhores homens do partido de centro, o PSD. Na Arena se juntaram os velhos golpistas da UDN e seus satélites e, como sempre ocorre em situações parecidas, alguns oportunistas, entre eles experientes peculatários e aspirantes às aventuras da corrupção.
O MDB era seletivo: a ele aderiam os que podiam contar com as dificuldades e não esperavam benesses
Como todos os partidos políticos, em todos os tempos e lugares, o MDB não era uma legião de anjos. Ao reunir pessoas de todo o país, de todas as crenças, o partido acolheu também os que esperavam, nas reduzidas oportunidades oferecidas, obter algumas sobras do poder. Não obstante essas dificuldades, e a natural divisão entre os mais à esquerda e os mais à direita, como sempre ocorre em todos os partidos — a agremiação contava com o bom-senso de seus grandes dirigentes, que o mantinham, em seu todo, no centro do espectro político, o que, naquelas circunstâncias, significava a esquerda possível. Ulysses e Tancredo, com a força de sua honra e dignidade pessoal, conduziram o MDB — e depois PMDB — dentro dos módulos republicanos. Infelizmente, eles se foram, na hora em que eram mais necessários, e com os dois partiram também homens da mesma estrutura de caráter, como Teotônio Vilela e Miguel Arraes, Franco Montoro e Renato Archer.
Sob o peso e maldição de uma sociedade patrimonialista e profundamente injusta, e com os aleijões trazidos pela legislação arbitrária, a redemocratização foi e continua sendo processo difícil. Contando com uma “classe política” — na definição de Gaetano Mosca — em processo de reacomodamento, o país e o mundo passam por um período crítico. No atual momento brasileiro, a discussão ética favorece a reaglutinação do velho MDB, como estímulo a nova e poderosa coalizão política, necessária aos desafios da atualidade nacional.
Contribuem para isso os episódios destas horas e dias, em que as denúncias comprovadas de corrupção permitem a purga, inevitável e necessária, em suas fileiras. O Brasil parece destinado a não compactuar mais com o velho estilo da política, de que são exemplos alguns dos ministros obrigados a se demitir do governo atual. No caso de pelo menos um deles, Nelson Jobim, o ministro não se encontrava à son aise na equipe governamental, nem a presidente Dilma Rousseff se sentia confortável com a presença de um auxiliar que se comportava com atrevida arrogância, e não com a postura de um chefiado.
O Brasil parece destinado a não compactuar mais com o velho estilo da política
O PMDB é interclassista, e tem seus votos bem distribuídos em todo o Brasil; não se identifica com a direita internacional, nem com a mal chamada social-democracia europeia. Se seus filiados e alguns de seus dirigentes tiverem a coragem de jogar ao mar o peso excessivo representado pelos passageiros e tripulantes inconvenientes e suas bagagens, é provável que a embarcação singre com mais facilidade os mares tempestuosos, contribuindo para a estabilidade do governo, do Estado e da nação.
Quanto mais próximo estiver dos ideais passados, maior será o peso de seu apoio aos esforços da presidente da República, na tarefa de administrar o Brasil nestes dias de turbilhão no mundo e de responder às necessidades internas prementes — como as de prosseguir na redução das desigualdades; desenvolver a economia ao ampliar o mercado interno; assegurar o bem-estar de nosso povo. É para isso que existem os estados nacionais e é para isso que os cidadãos elegem os seus representantes.
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