quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Raio X


Raio X
Na tarde de 8 de novembro de 1895, após o trabalho, o físico Wilhelm Conrad Rontgen (1845-1923), reitor da Universidade Wurzburg. na Alemanha, resolveu continuar alguns experimentos que fazia no laboratório de sua casa. Ele estava com sorte. Antes de cair a noite, um acaso o ajudaria a descobrir os raios X.
Foi naquela tarde que o homem ganhou a incrível capacidade ver o invisível. Como muitos físicos da época. Rontgen pesquisava o tubo de raios catódicos inventado pelo inglês William Crookes (1832-1919) anos antes.
Era um tubo de vidro, dentro do qual um condutor metálico aquecido emitia elétrons, então chamados raios catódicos, em direção a outro condutor. Quando Rontgen ligou o tubo naquele dia, algo muito estranho aconteceu: perto do tubo. Uma placa de um material fluorescente chamado platino cianeto de bario brilhou. Ele desligou o tubo e o brilho sumiu. Ligou de novo e lá estava ele. O brilho persistiu mesmo quando Rontgen colocou um livro e uma folha de alumínio entre o tubo e a placa. Alguma coisa saia do tubo, atravessava barreiras e atingia o platino cianeto. Por seis semanas, o físico ficou enfurnado no laboratório, tentando entender o que era aquilo. No dia 22 de dezembro, fez a radiação atravessar por 15 minutos a mão da mulher. Bertha, atingindo, do outro lado, uma chapa fotográfica.
Revelada a chapa, viam-se nela as sombras dos ossos de Bertha, na primeira radiografia da historia. Fascinado, mas ainda confuso Rontgen decidiu chamar os raios de "X" - símbolo usado em ciência para designar o desconhecido.
Passados l00 anos, não só o raio X deixou de ser obscuro como ajudou a clarear muita coisa para o olho e para a mente humana, sem ele não conheceríamos a estrutura das moléculas e não poderíamos ver as explosões que incendeiam o Sol. Também não teríamos informações importantes e curiosas sobre coisas tão diversas quanto o método de trabalho do pintor Van Gogh ou acredite, o torcicolo de múmias egípcias.
No início todos queriam ver O próprio esqueleto, os raios X causaram sensação. Seis dias depois de radiografar a mão de Bertha, Röntgen apresentou seu achado aos colegas da Universidade de Würzburg.
A imprensa noticiou o fato com destaque em 5 de,janeiro de 1896. No mesmo ano, os médicos adotaram a novidade. Imagine: com ela dava para ver ossos quebrados e órgãos doentes dentro do corpo humano. Logo começou a ser usada no tratamento do câncer.
Pesquisadores também radiografavam animais para estudos anatômicas
Na sociedade, a reação era de deslumbramento. Todos queriam ver próprio esqueleto. Rápido, o americano Thomas Alva Edison (1847-1931) inventou um instrumento com tela fluorescente que deixava ver a radiografia ao vivo, sem necessidade de revelar filmes,
Em 1902, um inglês bolou uma máquina de raios X controlada por moeda, como essas de refrigerante que temos hoje. Um pouco antes, em Nova Jérsei, nos Estados Unidos, deputados tentaram passar uma lei proibindo o uso da radiação. Eram defensores da moralidade e achavam que os raios permitiam a qualquer um ver os corpos nus de quem andasse pelas ruas. Já pensou? Seria a delícia dos Voieurs.
A lei é claro, não foi aprovada. Inclusive porque, no máximo, se veria os esqueletos pelados, E o verdadeiro risco da radiação continuou sendo ignorado. Em pouco tempo, surgiriam as lesões provocadas pelos raios X.
As principais vítimas eram os operadores das máquinas, que sofriam exposições repetidas. Vários perderam as mãos.
Antes de ganhar o primeiro Nobel de Física, em 1901, Röntgen enfrentou a desconfiança de cientistas. Muitos alegavam que os raios X já eram conhecidos. Crookes, o inventor do tubo de raios catódicos que Röntgen estava usando em suas experiências, tinha notado a presença de uma radiação do lado de fora do tubo, Achou que eram os próprios raios catódicos, mas errou.
Como se soube mais tarde, esses raios são feixes de elétrons e não conseguem atravessar o vidro.
Röntgen constatou que seus raios X projetavam sombra em filmes fotográficos e não podiam ser desviados por imãs.
Percebeu que era algo parecido com a luz, ou seja, ondas eletromagnéticas, Pois é exatamente isso que são os raios X: ondas eletromagnéticas de comprimento muito curto, cerca de um milhão de vezes menor do que 1 milímetro, mais ou menos a distância que separa um átomo de outro num sólido. A descoberta gerou polêmica, Em apenas um ano, mereceu 49 livros e panfletos, além de mais de l000 artigos de jornais. Contra e a favor. Röntgen não se abalou. Estava acostumado a polêmicas.
Na adolescência fora expulso da escola técnica de Ultrech, acusado de fazer caricaturas de um professor. Mudou-se para Zurique, na Suíça, (onde acabou se formando em engenharia hidráulica, em 1868. No episódio do raio X, optou por responder aos críticos com atitudes nobres: doou o dinheiro que ganhou com o Nobel à Universidade de Wursburg. "Eu considero que o trabalho de uma universidade deve beneficiar a todos, sem ideia de lucro", afirmou na época. Nada facilitou mais o trabalho dos médicos do que o raio X. "Isso sem falar que ele deu o pontapé inicial para o desenvolvimento de outros meios de ver o organismo. como a ressonância magnética, o ultrassom e a medicina nuclear".
As técnicas de detecção de imagem por raios X evoluíram, claro, mas também encontraram limites. A radiografia comum nunca foi eficiente para visualizar tecidos moles (o fígado, os intestinos, o cérebro) que deixam a radiação passar quase completamente e não criam bons constrastes. A proeza só foi possível com a tomografia computadorìzada, uma superevolução do raio X, que rendeu um Nobel ao inglês Godfrey Hounsfield e ao americano Aflan Corrnack, em 1979. O paciente fica no interìor de um grande anel que gira em torno dele. O anel emite e capta a radiação de muitos ângu1os diferentes. O resultado equivale a cerca de 130 000 radiografias.
Num computador, os sinais colhidos são transformados em imagens tridimensionais, com detalhes precisos de qualquer parte do organismo. Mas a tecnologia promete resultados ainda mais incríveis, O Lawrence Livermore National Laboratory, nos Estados Unidos, está construindo um super tomógrafo, que trabalha associado a um microscópio de raios X.
Ele poderá distinguir áreas de apenas 0,000001 centímetros de largura e fornecer imagens tridimensionais de células vivas sem lesá-las.
A terapia por raios X também melhorou. No princípio, irradiava-se o local afetado pelo câncer, mas se atingia também outros órgãos. Hoje não. Programas sofisticados de computador localizam milimetricamente o tumor e determina a dose certa de radiação a ser aplicada.
Assim, os efeitos colaterais são muito menores. A grande ambição dos biólogos de nosso tempo é conhecer todos os genes do organismo humano para, em seguida, determinar a estrutura de todas as moléculas.
Assim, eles vão poder construir ferramentas químicas, genéticas e biológicas contra todas as doenças humanas, Parece megalomania, mas os raios X podem transformar esse projeto em realidade, Eles já revelaram a estrutura de várias moléculas, A do DNA, por exemplo, que carrega a herança genética humana, foi identificada em 1953.
A técnica que realizou a façanha foi a dìfração de raios X, ela funciona assim: um feixe de raios incide sobre uma molécula e, ao encontrar um dos átomos dessa molécula, faz os seus elétrons oscilar.
Com isso, todos os elétrons geram mais raios X e do outro lado da molécula sai um chuveiro de raios. Isso é a difração.
A análise desse chuveiro permite achar a posição de cada átomo e determinar a estrutura da molécula, "o uso do método já rendeu onze prêmios Nobel".
Mas os raios X apropriados para a difração não são os tradicionais. São aqueles emitidos pelos aceleradores circulares de elétrons, que produzem a chamada luz sincrotron, abrangendo as radiações visíveis e as invisíveis.
Esses raios X são mais homogêneos e tem um feixe mais intenso, o que os torna muito mais eficientes para ver as menores partes da matéria.



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